Se as pandemias fossem professoras, certamente o mundo seria seu pior aluno. Cinco anos atrás, às portas de hospitais lotados, aprendíamos pela dor a necessidade urgente de prevenir catástrofes sanitárias. De máscaras improvisadas, acompanhávamos incrédulos a incapacidade dos governos diante da força invisível e mortífera de um vírus, que sequer tinha rosto, mas que tinha nome e sobrenome: SARS-CoV-2.
O que fizemos desde então? Aprendemos? Evoluímos? Roberto Kalil Filho, um dos médicos mais respeitados do Brasil, conhecido por sua serenidade imperturbável e pelos telefonemas angustiados das mais altas autoridades do país durante crises médicas, recentemente disse no Roda Viva que não estamos preparados para um primo distante (ou próximo) da COVID-19. Segundo Kalil, esquecemos rapidamente, talvez por ser mais fácil esquecer do que resolver. Ou talvez porque lembrar dói. E política, sabemos bem, odeia dor.
Neste exato momento, março de 2025, enquanto governos distraem o mundo com embates tarifários, disputas geopolíticas e um festival interminável de polarização ideológica, o sistema de saúde pública agoniza sob o mesmo velho subfinanciamento denunciado por Kalil. Nos Estados Unidos, enquanto democratas e republicanos transformam orçamentos em piadas de mau gosto para o eleitor, o sistema de saúde permanece refém de seguros privados e preços exorbitantes, esperando o próximo susto para revelar suas fragilidades.
Na Europa, o antigo berço da racionalidade iluminista não faz muito melhor: a discussão em Bruxelas gira em torno de cotas de carbono e subsídios agrícolas, enquanto hospitais rurais, do interior espanhol à periferia da Romênia, operam com equipamentos que fariam Florence Nightingale chorar.
A Ásia, potência econômica incansável, segue fechada numa armadura de silêncio institucional que torna improvável qualquer resposta rápida em caso de um novo surto. A ironia é clara: o continente mais afetado pelo SARS-CoV-2 segue apostando que o segredo de Estado protege mais do que máscaras e vacinas.
E o Brasil? Bem, seguimos em nosso samba político que parece desafinar propositalmente diante de qualquer planejamento coerente para crises futuras. Kalil nos lembra que trocamos ministros da saúde como técnicos de futebol após três derrotas seguidas. Não há consistência, não há memória institucional, há apenas improvisação. Um eterno retorno ao ponto de partida.
A disseminação de notícias falsas, que parece mais rápida e contagiosa do que qualquer vírus, se consolidou como fator central no enfraquecimento das políticas de saúde pública. Quem acreditaria que uma simples mentira pudesse competir com uma vacina? Kalil diria: “A Fake News mata”. Mas quem ouve médicos nesses tempos em que influencers têm mais credibilidade que cientistas?
A conclusão é amarga e, talvez por isso, necessária: precisamos parar de repetir erros e aprender com a história. Mas, então, surge a pergunta incômoda: como aprender com algo que mal conhecemos? A maioria das pessoas desconhece a história porque desconhece a si mesma. E sem conhecer-se, continuaremos a andar em círculos.
Talvez precisemos de outra pandemia, outro choque global, para que aprendamos aquilo que já deveríamos ter aprendido há muito tempo. Ou talvez, simplesmente, devamos abrir os livros que se acumulam silenciosos nas estantes empoeiradas, esperando alguém curioso o suficiente para descobrir que todas essas lições já foram dadas. Só não foram estudadas.
Até lá, que Deus, a ciência ou a simples sorte nos proteja.
Sobre o Autor:
Carlito de Souza – Corretor de imóveis e seguros, fotógrafo por hobby, motociclista por essência, e alguém que escolhe a luz dos fatos em vez da sombra das narrativas.
Fontes:
Entrevista Dr. Roberto Kalil Filho – Programa Roda Viva, Março de 2025; Organização Mundial da Saúde (OMS); Dados oficiais Ministério da Saúde.
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